Criada e mantida pelos empresários do ramo farmacêutico
Reajuste de preços

A expectativa da indústria No próximo dia 31, os medicamentos comercializados no Brasil serão reajustados pelo índice anual calculado pelo governo federal. Mas a indústria teme que a fórmula de reajuste desta vez seja ainda mais complicada que em anos passados – e que o reajuste fique, novamente, bem abaixo do aumento de custos do setor. Nesta entrevista, Nelson Mussolini, presidente executivo do Sindusfarma – Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo – fala sobre as preocupações do segmento com essa defasagem entre custos e preços e as consequências dissoEstamos em meados de fevereiro e ainda não se conhecem nem a fórmula nem os números do reajuste anual de 31 de março. Isso preocupa?É um absurdo para um setor que cresce a dois dígitos por ano, muito acima do que cresce o Brasil, estar a 45 dias do aumento de preços e ainda não conhecer a fórmula de reajuste – que este ano deve ter alguns fatores alterados. A esta altura, porém, nossa maior preocupação é como o investidor vai formular seus planos em relação a este ano, sem saber como será o reajuste de preços e o reajuste de salários. Isso deveria ter sido divulgado em setembro do ano passado, para um melhor planejamento. Nós podemos estar trabalhando numa expectativa de aumento zero para certas categorias de produto.De qualquer forma, a indústria aguarda um aumento inferior ao incremento de custos no ano?Isso é uma certeza. Em janeiro de 2013, o dólar era R$ 1,92. Este ano, fechamos janeiro a R$ 2,42. Essa diferença de 50 centavos atinge a veia do custo.Mas como lidar com essa distorção econômica? Cortando custos? Isso é possível?Não, porque estamos no limite da redução de custos. O que fazia a indústria sobreviver até agora é que a redução de margem vinha sendo minimizada pelo aumento de faturamento – claro que com um esforço muito maior nas vendas. Mas agora preocupa o fato de que o aumento de 16% em valores ou de 12% em unidades nas vendas do ano passado não vai compensar o aumento de custos. Além do dólar, a folha de pagamento foi reajustada em 8,5% no ano passado, para um reajuste médio de preços nos medicamentos de 3,56%. Está começando a ficar impraticável. Nossa preocupação pode ser representada, em números, pelo quadro que mostra a evolução dos custos de produção, da inflação e dos preços dos medicamentos desde 2006 e que tenho apresentado às autoridades do governo: reajuste dos medicamentos do nível 3, ou seja, ainda cobertos por patentes – 27%; INPC – 49%; reajuste salarial – 67%. Ninguém cortará força de vendas ou força de trabalho na fábrica. Onde se corta? Nos investimentos em novos produtos, novas tecnologias. O Brasil está colocando em risco a vital questão dos biossimilares. Se não houver remuneração do capital, não haverá investimentos nesse negócio. Até quando e onde conseguiremos levar essa defasagem? Vai chegar uma hora em que não será possível pagar a conta.O que o governo alega? Medicamentos são produtos diferenciados, muito sensíveis?Sim e nos recomendam reduzir o desconto na ponta... Os descontos na ponta ocorrem pela concorrência, mas muitos produtos estão com suas margens tão apertadas que não podem receber descontos. Há empresas de nosso setor trabalhando com margem zero. Mas todos continuam trabalhando porque o Brasil é o país do futuro. A indústria farmacêutica brasileira está apoiada em três pilares de sustentação. O primeiro é a Anvisa, a partir do momento em que passou a exigir de todos as empresas os mesmos testes de qualidade e os mesmos cuidados na elaboração de dossiês. Isso acabou com a concorrência desleal pela diferença de qualidade. Todos têm que cumprir as boas práticas de fabricação. Acabou o fundo de quintal. O segundo pilar é o nível de emprego. Com nível de emprego alto, uma pessoa com enxaqueca compra remédio; se estiver desempregada, vai para o quarto escuro e espera a dor passar. O terceiro pilar, fundamental, é previsibilidade. Pararam os solavancos e os soluços de mercado. O ministro de plantão não mais acorda com a ideia de mexer ou congelar preços naquele dia. O capital é um bicho arisco – a qualquer alteração das condições ambientais, ele se retrai e paralisa. Ora, a partir do momento em que se começa a mexer nesse pilar, com intervenção nos preços, surge um problema.A anunciada bioequivalência entre similares e genéricos também preocupa a indústria?Sim. Quando, em 2003, anunciou-se a exigência de bioequivalência entre as duas classes de medicamento, em nenhum momento a Anvisa mencionou que o resultado dessa exigência seria a intercambialidade dos medicamentos mais à frente. Em nenhum momento se tocou nesse ponto. A intenção inicial era apenas equiparar a qualidade entre esses dois segmentos. Não é função da Anvisa a interferência na prática comercial.Mas a intercambialidade vai afetar a venda no balcão da farmácia?Sim, porque a intercambialidade só deveria ser feita como acontece em outros países do mundo: produtos de marca por genéricos. A ideia do governo parece ter sido criar mais uma marca forte, como o Mais Médicos, agora no campo dos medicamentos: a EQ, produtos equivalentes. Isso, na visão do governo, aumentaria a concorrência e reduziria os preços. Mas o que provavelmente vai acontecer é que teremos apenas duas ou três indústrias especializadas em EQ e a concorrência vai diminuir, em vez de aumentar – com provável desemprego na classe dos propagandistas vendedores.Vocês levaram essas preocupações ao governo?O então ministro Alexandre Padilha nos ouviu, mandou prosseguir a consulta pública, e propôs discutir todos os impactos que isso pode gerar no mercado em outro fórum, com prazo de 120 dias. Vamos aguardar.